site em português
  • Página inicial | 
  • Fale Conosco | 
  • Marketing
» Página inicial » Notícias » Grão de areia - África do Sul

Notícias

Grão de areia - África do Sul

publicada em 09/04/2010

Alfredo Rainho

Com a próxima Copa do Mundo de futebol na África do Sul, o país pouco conhecido neste lado do Atlântico,passou a ocupar as telas da TV diariamente. A ponta do continente é lembrada nas lições de história pela mudança do antigo nome de Cabo das Tormentas para Boa Esperança, depois da passagem das caravelas portuguesas. Vasco da Gama batiza time famoso no Brasil e também na África do Sul. Na escola estudamos Os Lusíadas e Camões, hoje, menos que antigamente, o poeta de um olho só ainda ocupa seu lugar nas escolas.
A África do Sul ficou também conhecida pelo regime de separação racial, apartheid, palavra da língua Afrikaans, idioma dos descendentes dos antigos holandeses, os boers, ou fazendeiros. Kuger Park enche a imaginação de todos nós com seus leões, elefantes, rinocerontes e animais selvagens.
Mas com tudo isso, é um país de problemas que pouco a pouco vão sendo solucionados. Nações africanas desceram para o sul do continente e lá se estabeleceram, com línguas, culturas e tradições diferentes. Nem sempre se entenderam bem. Da Europa imigraram holandeses, depois franceses huguenotes fugidos da perseguição religiosa e finalmente os ingleses. Os bantus, africanos, ocupavam as terras, e enfrentaram com desvantagem os novos povoadores, detentores de técnicas avançadas, armas de fogo e canhões. Lutas, guerras e guerrilhas. E acima de tudo ódio.
O pior ainda estava por vir. No meio do século passado os chamados afrikaners, brancos, criaram leis separatistas, racistas, em que toda a população era dividida em brancos ou europeus e os não-brancos, na língua Afrikaans: blankes e nie blankes. Os não brancos formavam a grande maioria da população, 90% , africanos bantus, mais os mestiços, coloreds, de descendência indu e malaia, e asiáticos, como chineses. Leis e mais leis regulavam a vida em minúcia. Proibição de casamentos entre raças diferentes, áreas especiais para moradia , escolas segregadas, hospitais e ambulâncias para cada grupo racial e transporte público separado. Nenhuma mistura permitida. Os brancos gozavam de todas as regalias, direitos políticos, bons hospitais e universidades. Para o resto do povo classificado como não-brancos nenhuma regalia.
O regime da separação racial teve fundo religioso, começara na chamada Igreja Reformada Holandesa, um ramo protestante que vem desde o século 16. Conheci na África do Sul uma senhora de origem holandesa, religiosa, que piamente acreditava que os negros não tinham alma. Outros afrikaners chegavam ao ponto de afirmar que no céu, haveria também categorias separadas para brancos e não-brancos. Leis e mais leis regulamentavam as categorias de trabalhadores segundo a classificação racial, assim um maquinista de uma locomotiva tinha de ser branco,no caso de motoristas, um bantu poderia dirigir um pequeno caminhão, mas uma carreta pesada exigia motorista branco. Tudo especificado, uma enorme burocracia (de brancos) para controlava o regime trabalhista. O empregado negro não podia ter seu quarto em baixo de um mesmo telhado do patrão branco, era separado da casa. Era a lei.
Nelson Mandela um advogado de grupo xhosa, tornou-se líder da luta contra o apartheid. Com outros fundou o chamado ANC (Congresso Nacional Africano). O governo era de brancos, só eles podiam votar. O ANC foi classificado de terrorista e comunista. Mandela e outros dirigentes foram julgados e enviados para a prisão da ilha Robben. Durante os vinte e cinco anos de prisão, com trabalhos forçados, ele que falava xhosa, sua língua natal, e o inglês, estudou a fundo a língua afrikaans, praticando com os guardas, todos afrikaners. Chegou à conclusão que o enfrentamento de afrikaners e pretos poderia terminar numa sangrenta guerra civil. A solução seria o entendimento, mas como convencer a minoria branca, que detinha todo o poder, de negociar com aqueles considerados terroristas e comunistas? Do lado dos brancos, uns poucos, acreditavam também num entendimento de raças, ao contrário da grande maioria dos superracistas brancos organizados em movimentos de inspiração nazista e que pregavam a pureza da raça branca.
O processo foi longo. Mandela foi finalmente libertado e manteve os primeiros contatos secretos com o governo branco. Já então passava dos setenta, mas sua figura de estatura alta, personalidade amável, empregando sempre a língua afrikaans, conseguiu obter os primeiros resultados positivos de entendimentos com o governo, resultando na primeira eleição democrática no país. Mandela foi eleito presidente, apesar de feroz oposição dos grupos afrikaners.
Hoje a África do Sul tem seu segundo presidente negro, o zulu Zuma. O país está em festa com a Copa. Mas na pequena cidade Ventersdrop, a 160 km de, Johannesburg, chamada pelos sul-africanos de Jobo, um crime abala o país. Em sua fazenda o mais importante líder afrikaner Eugene Terreblanche é assassinato por dois empregados negros, um menor de idade, por não receberem salário há três meses. Um crime comum, mas ocorre que Terreblanche, de 69 anos, era chefe de uma verdadeira organização paramilitar com o nome de Resistência Afrikaner, com grupos uniformizados, armados, e a insígnia de três “7” misturados, lembrando a suástica nazista.
O perigo de enfretamento dos fazendeiros boers com a população negra volta a tornar-se nova ameaça, basta um pretexto. A tensão afrikaners/bantus tem pontos de semelhança com outra crise, israelenses/palestinos. Ambas sem solução por enquanto.

fotos vídeos como chegar